Acaba de ser inaugurada a Galeria Reocupa, que fica no saguão da Ocupação 9 de Julho. Na Ocupação 9 de julho vivem mais de 100 famílias, distribuídas em um prédio do INSS que ficou fechado por cerca de 30 anos. Tudo lá é extremamente organizado. Com todas as carências, a Ocupação reflete algumas prioridades do MSTC (Movimento Sem Teto do Centro), liderado pela incrível Carmen Silva, que aparece interpretando a si mesma no premiado filme da Eliane Caffé “Era o Hotel Cambridge”.
A Ocupação, além das moradias, tem Biblioteca, um Brechó de roupas e a Cozinha da Ocupação, um projeto realizado com vários ativistas que não só implantaram uma cozinha industrial coletiva no local, mas também promovem um almoço mensal aberto ao público e uma série de eventos. E agora, inaugura-se a Galeria Reocupa, um projeto artístico que visa colaborar para o posicionamento da Ocupação 9 de Julho como referência para discussão e reflexão sobre cultura, cidade e sociedade contemporânea.
A gestão é compartilhada entre artistas, curadores, arquitetos e gestores culturais que atuam em parceria com os moradores da ocupação. A ideia é que Galeria Reocupa funcione como um atrator entre diversos atores do circuito da arte e como instrumento de construção e articulação entre o meio artístico, os moradores da Ocupação e a população do centro de São Paulo.
Nelson Félix na Galeria Reocupa
A primeira mostra da Galeria é do artista Nelson Félix que preparou Esquizofrenia da Forma e do Êxtase, um conjunto de esculturas e desenhos específicos para o local. Lembro, no entanto, que quem for à Ocupação pode visitar também um outra exposição. Trata-se de Mulheres de Bronze, de Virginia de Medeiros, que trabalhou com as mulheres da Ocupação nessa obra.
Os trabalhos de Nelson Félix fazem parte de uma ação desenvolvida pelo artista em três locais distintos: primeiramente em dois pontos extremos da América, Ushuaia e Alasca o segundo, no edifício da Ocupação da 9 de Julho, e, por último, no prédio da Bienal de São Paulo, como parte da mostra internacional, apresentando uma série de sete esculturas.
Para a obra externa, Nelson Félix colocou enormes Mandacarus em duas janelas. Isso aparece em uma foto da exposição e o artista contou, num bate-papo com o público no dia da abertura, que a presença dos Mandacarus também contribuiu para uma aproximação imediata com os moradores. Isso porque muitos conheciam esse cacto que é típico do Semiárido nordestino, mas que consegue se adaptar a praticamente qualquer ambiente.
A escolha dessa planta não poderia ser mais sensível. O Mandacaru cresce no campo sem qualquer trato. Sua semente não escolhe lugar para nascer. O crescimento fica na dependência dos nutrientes do solo em que germina. É uma bela metáfora para essa Galeria e a história dessa Ocupação. Que floresça!
Esquizofrenia da Forma e do Êxtase. Nelson Félix. Galeria Reocupa. Até 02 de fevereiro.
Transcrição da coluna Ouvir Imagens, de Giselle Beiguelman, veiculada toda segunda-feira, às 8:00, pela Rádio USP (93,7).
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