Mapa em Realidade Aumentada traz novas dinâmicas ao jogo e problemas na relação entre público e privado

A próxima versão do Pokemon Go deve ser um mapa do mundo em Realidade Aumentada, feito pelos jogadores. É o que anunciou o presidente da Niantic, a empresa desenvolvedora do Pokemon na última quarta-feira.

A Realidade Aumentada é uma tecnologia que suplementa o mundo físico com informações, fazendo com que coexistam no mesmo espaço objetos virtuais e objetos reais. Você aponta o seu celular e revela camadas que estão associadas a lugares específicos. Essas camadas podem ser dados sobre poluição, informações históricas sobre edifícios, imóveis à venda e seu preço e até obras de arte.

O caso mais famoso, certamente, é o do projeto de Jeff Koons com o aplicativo Snapchat que levou suas obras a vários lugares do mundo e foi também a primeira obra de arte a ser pixada virtualmente, com Realidade Aumentada, por outro artista. Tudo isso só foi visto, porém por quem estava no Central Park.

Obra de Jeff Koons comissionada pela Spanchat (out. 2017). Abaixo, a obra pixada, também em Realidade aumentada

Tudo isso pode parecer muito difícil de imaginar quando é descrito em palavras, mas quando se lembra do que foi a febre do Pokemon Go, há dois anos, com milhares de pessoas munidas de celulares na mão, caçando criaturinhas esquisitas que brotavam nas suas telas, nas ruas, tudo se esclarece.

Mas o desafio que se coloca agora é muito maior. Fazer um mapa do mundo 3D, ainda que só cobrindo espaços públicos, na escala do jogador, como pretende a Niantic, depende de uma capacidade de coletar e processar os dados que outras empresas, como a Apple a Google ainda não resolveram. (Muito embora a Google tenha anunciado recentemente que lançará até o fim do ano um recurso de Realidade Aumentada para ser usado no seu serviço de mapas, o Google Maps).

Experiência de jogo e privacidade

Tendo um mapa em RA os jogadores podem criar estruturas que podem ser visualizadas por outros usuários nos locais em que o jogo acontece e isso certamente enriquecerá significativamente a participação e a experiência do jogo. Mas não podemos nos esquecer que a cartografia, hoje, na era do capitalismo-plataforma, como indicou Benjamin Bratton, migrou da esfera de competência exclusiva dos Estados, para a das empresas de tecnologia que atuam nas chamadas nuvens computacionais, como a Google. E que parte desse “serviço” é delegado ao usuário, que marca no mapa os pontos de interesse e deixa lá registrado os rastros por onde passou.

O presidente-executivo da Niantic, John Hanke, que atua na área de mapeamento há muitos anos e trabalhou na divisão “Geo” da Google (Google Earth, Google Street View, Scketch Up etc), declarou da que a empresa permitirá que desenvolvedores terceirizados usem seu mapa de Realidade Aumentada, coisa que os executivos da empresa acreditam ter potencial para tornar-se um negócio multibilionário. Se levarmos em conta que, até agora, Pokemon Go teve 800 milhões de downloads, o prognóstico deve estar mais que correto.

Há ainda que se resolver além de pendência técnicas, questões éticas e legais com relação às novas dinâmicas que se impõe nas relações entre público e privado nessa nossa era pós-virtual. Um mundo em que as redes se tornaram tão presentes no cotidiano e que o processo de digitalização da cultura é tão abrangente, que se tornou anacrônico pensar na dicotomia real/virtual. Nesse contexto passa a ser mais que urgente questionar: quem coleta nossos dados, para onde vão e o que é feito desse manancial de registros acumulados.

Pokemon Go

Virtual Vandalism: Jeff Koons’s ‘Balloon Dog’ Is Graffiti-Bombed

Transcrição da coluna Ouvir Imagens de Giselle Beiguelman veiculada semanalmente pela Rádio USP.

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