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O Livro depois do Livro


o que não é

o que é

de onde veio

para onde vai

 

 

 

 

Não se pensa aqui sobre um não-livro. Isso não passaria de mais um capítulo da história apocalíptica que a indústria da informática  vem elaborando nos últimos dez anos.

Narrativa messiânica, confere à Internet o poder e a missão de ser marco inaugural de uma nova época.

Alimentada pelo marketing do novo milênio, reitera o já entendiante blá-blá-blá sobre a grande teia que nos envolveria candidamente numa aldeia global...

Falso confronto entre fim e começo, impõe polaridades  entre a cultura impressa e a cultura digital que se valem de antinomias inexitentes.

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O Livro depois do Livro  é um ensaio sobre literatura, leitura e mídia no contexto da Internet.

Tem como foco narrativas não-lineares,  trabalhos que conferem à linguagem de programação conteúdos textuais e estéticos e criações que discutem e problematizam a condição do livro e do leitor.

O site gira em torno de uma estante, cujas prateleiras, que acomodam sites de cyberliteratura e web arte, são interceptadas por intervalos da leitura.

São " páginas vazias ", que se desvanecem, indo do cinza ao branco, e impedem o retorno à estante pelos recursos do browser.

É  preciso apelar à barra da ferramentas do  site, a fim de mover-se entre seus livros a areia e  zonas da fricção.

Não somente cada volta à estante implica em um  novo itinerário de leitura, mas toda a seleção significa correr o risco de mudar o trajeto, perder o ponto de partida e redirecionar da leitura.

O avanço para um trabalho selecionado faz o leitor sair do site de O Livro depois do Livro.

Interessante paradoxo: Aqui, no espaço cuja a substância é a memória, o que prevalece é a arquitetura do esquecimento.

A estante funciona agora como nó de uma rede, um jogo de prateleiras giratórias, uma máquina nova da leitura....

Pequenas animações interceptam a leitura de trabalhos jogando com a condição textual da imagem on line, e, ao mesmo tempo com a condição imagética do texto na tela.

São imagens que exibem textos e enfrentam a estranha passagem imposta pela web. No "verso" da tela, no código fonte, uma situação se define: a Internet não passa de um grande texto. Na frente, na superfície da tela , o texto se revela como imagem.

Esse estranhamento introduz dimensões estéticas que vão além do horizonte técnico da multimídia. É um estranhamento que pode estar escrevendo uma outra linha na história do livro. Uma história que, do ponto de vista da cultura material, tem sido bastante estável desde a Renascença...

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Tão estável é o livro impresso que a Internet ainda não conseguiu inventar um vocabulário próprio para a visualização de seu conteúdo na web. As telas dispõem páginas.

E isso não significa reconhecer que a Internet apenas incopora um repertório cultural. Recusa-se apenas o raciocícnio por exclusão.

Até mesmo porque a riqueza da cultura contemporânea reside na sua capacidade de criar nas e a partir das intersecções entre as linguagens.

São as zonas de fricção, portanto, entre as culturas impressas e digitais, o que interessa.

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É surpreendente, porém inegável. Da época clássica aos dias de hoje, o livro, como objeto, mudou muito pouco.

Essa estabilidade é intrigante, haja vista o valor simbólico da descartabilidade para a indústria cultural.

Ela faz pensar na historicidade das práticas de leitura, no  imbricado território da recepção literária, e também do implacável mercado das ilusões perdidas de que fala Balzac.

Mas ela se impõem como história dos lugares da leitura e dos suportes de interação entre o leitor e o texto.

Mais do que receptáculos de conteúdos textuais e hipertextuais, esses suportes são contextos de leitura onde as significações se constróem.

Um repertório de gestos, um jogo tátil entre a mão e o papel (ou o "mouse"), uma constelação de objetos e de instrumentos de visão definem a posição da leitura neste mundo.

Posições instáveis, certamente. Trata-se do enigmático mundo do Livro de Areia de que fala Borges. Um livro em que é impossível retornar à pagina lida. O livro dos livros. O livro da leitura.

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Não se pensa em um mundo da leitura sem pensar numa determinada leitura de mundo e no horizonte imaginário de uma época.

Implode-se a horizontalidade da linha e a própria noção de volume. A descostura intrísceca a esse processo impõe pensar que na Internet,  a tela de computador não é apenas o suporte da leitura, é uma interface.

E isso faz toda a diferença. O hipertexto nos coloca diante de uma nova "máquina de ler", que faz de cada leitor um editor potencial.

Além disso, por ser de fácil reprodução e estar disponível numa rede de computadores, a literatura digital traz a relativização da autoria no seu próprio modo de produção e realização técnica.

Ela promove assim um reenquadramento profundo das experiências de leitura e de lugares da literatura, numa escala e num ritmo sem precedentes históricos desde a aparição do livro impresso.

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Tornam-se relativas as diferenciações de texto, imagem e lugar,  muito embora a metáfora da tela com a página mascare essa situação inédita.

O fato é que a web é um exercício de ilusão de ótica. O que se dá a ver na superfície da tela não está lá. Está no código-fonte.

Não importa se o que é visto é texto ou imagem. O que pode ser lido depende de uma rota textual de endereçamento que implode a horizontalidade da linha e rearticula a relação da literatura com o livro, para além da noção do volume.

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